Coluna do Luan

terça-feira, 29 de julho de 2008

As facetas de meu retorno

Foram doze, eu disse doze. Esse é o número de e-mails que recebi durante minha ausência neste espaço tão pessoal que chamo de coluna. Aqui, há um ano, tive meu primeiro ato virtualmente inteligente: a de publicar tudo que, porventura, eu viria a escrever. Durante esse período minha vida passou por inúmeras situações, minha mente evoluiu do ponto de vista existencialista, e eu descobri uma essência ainda mais reservada de mim mesmo. O Luan que há alguns anos era acometido por desilusões sociais e pessoais, hoje se diz mais seguro de si, de suas visões. Mas ainda me deixo levar por devaneios, afinal sou um eterno pensador, um eterno sonhador...

Meus pais viviam dizendo que eu era algum tipo de “ocultista”. Eu me afastava das pessoas e ficava com meus sabores intelectuais da ocasião. Faço isso até hoje, leio escondido, escrevo na escuridão da madrugada. A idéia de ter alguém observando meu ato de escrever me tira do eixo. “Deixe-me só, senhor humano”. Já fui apelidado de autista, nerd, pseudo-intelectual, “quatro-oio”, bigodinho de carroceiro, o feioso, “o pernas-torta”, frangosul e por aí vai... Cada apelido corresponde a certa época de minha existência. Atualmente, cheguei ao estágio de poeta, porto seguro, muchachito... O que muito me orgulha, o que muito me emociona. Há anos procurava por alguém que eu achava não existir. Então me matriculei em uma cadeira chamada “Redação para TV”. Não esperava encontrar a mulher da minha vida ali, sentada na companhia de um amigo fiel e sincero, que também dispões de laços mais do que afetivos comigo.

Pois eu a conheci, e por ela eu escrevo enfrentando multidões. Por ela eu leio em público, recito poemas, compro rosas, crio crônicas sentimentais ao pé de seu ouvido. Com ela possuo uma segurança que faz de qualquer autista um ser sociável. Porque é ela que eu amo. E nesse instante, é por ela que eu escrevo. Não só por mim. Eu estava precisando amar, ser amado, sonhar mais distante com alguém que sonhe tanto quanto. Embora seja realista.

Então abro minha caixa de e-mails e me deparo com doze mensagens vindas de amigos-leitores. Pensei: é hora de voltar. Não gosto de estipular prazos, prometi que voltaria quando me desse vontade, quando minhas inquietações e meus sentimentos precisassem urgentemente de vozes verbais. Cá estão, alinhados em um alfabeto legível, escrito por um humano não-praticante, mas acima de tudo falível. Sujeito à vida.

Amigos e amigas, durante as últimas semanas me dediquei a escrever cartas para minha eterna amada (amor, tu as receberás em breve), a dar início em um projeto literário que há meses não saía da gaveta, a ler exemplares atrasados, e o principal: a refletir. Por isso achei que o melhor seria “sumir” por uns tempos. Agora basta. Obrigado aos que tiveram a paciência de me esperar, um beijo a todos.


L.I.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Elisabeth

O mundo parecia um tribal venezuelano, só faltava o Chávez dependurando em uma pêndula de ouro recitando poemas psudo-socialistas. A tarde estava escura em Caracas quando decidi fazer algo romântico. Comprei um envelope e algumas rosas. A destinatária? Não sei ao certo. Poderia ser a russa que me espreitava através da porta de uma loja de roupas baratas. Ou então, a espanhola exibicionista fã de Karl Marx. Tinha ainda a americana de seios fartos que era fugitiva da gestão Bush. Todas representantes do sex in cash. Dizem por aí que a Colômbia é o país campeão na América do Sul quando o assunto é prostituição. Mas a Venezuela ganha. Nas avenidas oriundas de Caracas se enxerga a demagogia de um governo de princípios ditatoriais, vê-se a ideologia Chavista plantando cenouras de dólares enferrujados nos crânios dos burgueses capitalistas. O dia estava pouco comum com nuvens sobre minha cabeça e prostíbulos ao meu redor. As rosas enfeitavam minha enorme mão, o envelope vazio, metaforicamente buscava uma alma para preenchê-lo. Caminhei alguns metros até encontrar Angenor, saltitante como grilo. Angenor, carioca da gema, pediu-me alguns dólares trocados. Alertei-o que estávamos em território Chavista. Então Angenor lembrou da época em que a Venezuela fora mais pragmática consigo mesma. Lembrou-se de Noelma, a esposa que o abandonou em plena Copacabana. “Ela me deixou na frente de todos, tinha mulher de fio-dental lá”. Angenor sempre foi apaixonado por mulheres que ausentavam vestimentas. Veio parar em Caracas por acaso, tomou o vôo errado e virou cafetão. Esse é o resumo de sua história. Pedi a ele a mais branquinha de todas, “tem que iluminar minha alma”, disse. Angenor havia me prometido uma inglesa de seios moderados, com ares franceses. Veio à Venezuela com fins acadêmicos, estudar o governo, acabou se prostituindo com a morte de seu pai na Inglaterra e com a falta de dinheiro para sair do país cognitivamente socialista. O nome da garota era Elisabeth. Bem original. Acabei cedendo alguns dólares a Angenor em troca de prazer carnal.

Elizabeth falava um péssimo e arranhado espanhol, o sotaque inglês deixava seus lábios ainda mais carnudos. Pedi a ela que se livrasse dos verbos e fizesse o que tinha que ser feito: Sexo. Nada mais. Entreguei o envelope e ela colocou um anel com o se nome gravado. Jogou o envelope no chão e pediu que eu o levasse depois do ato. Durou pouco. Uma hora e meia. Ergui minhas calças como um velho comunista chavão da década de 50. Juntei o envelope e o coloquei no bolso esquerdo de minha calça. Deixei 300 dólares sobre a cômoda e fui embora.

Cheguei em casa cansado, ainda com as rosas e com o envelope. Eu sabia que dentro havia um anel com o nome de Elizabeth escrito. Quando o abri me deparei com os 300 dólares que eu designara a Elisabeth e um bilhete escrito a punho em um deteriorante espanhol, algo como: “No queiro dinero, quiero solamente amor”. Elisabeth havia se declarado a mim como uma donzela sem dono, ao relento. Submetendo-se à maré social. Liguei imediatamente para Angenor e pedi o contado de Elisabeth. Angenor demorou a explicar que ela não tinha telefone, não tinha casa, não tinha nada. Para Angenor, era apenas uma vagina lucrativa.

Sai para caminhar um pouco e refletir sobre as palavras de Elisabeth que não era uma prostituta qualquer, jovem, da alta classe inglesa... Lembrei-me da época em que eu morei em Londres, antes de voltar para o Brasil, havia conhecido uma garota por quem me apaixonei. Não sabia seu nome, mas lembrava de seus olhos, apimentados e grandes. Sedutores. A garota sumiu de minha vida, foi estudar distante de Londres. Voltei ao Rio com o coração partido, minha primeira dor de amor na adolescência. Anos mais tarde eu me mudaria para Caracas, trabalharia de repórter em um jornal local ganhando um salário equivalente a de um diretor de redação no Brasil. Aqui as coisas são mais fáceis. O Chávez complica um pouco, quer nos calar, mas ele no fundo não consegue. Não chega nem perto do que foi a ditadura militar brasileira. Sei, porque estudei. As vidas nos levam a tantos acasos... Agora quanto a Elisabeth é mesmo intrigante.

Surpreendentemente eu a vi, há duas quadras de meu prédio. Ela estava lívida, e com uma expressão incrivelmente boçal disse-me: I love you... Em perfeito e bom inglês britânico. O sotaque era o mesmo que eu havia escutado anos antes, quando residia em Londres. Descobri seu nome. E ela me descobriu. Não veio para pesquisar sobre o governo e sim sobre mim. De como eu vivia minha vida... Caí direitinho no seu golpe de prostituta... Na surpresa eu me entreguei, subimos ao meu apartamento e fizemos amor, sexo é para os fracos. Eu fora um fraco, queria encontrar nas outras o que não havia saciado em Elizabeth anos atrás. A saciei carnalmente sem saber que era ela, agora deveria me entregar de maneira verdadeira. A história poderia acabar aqui com um final feliz, em meio a ardente Venezuela.

Elizabeth tirou de mim todo o ódio que eu tinha quanto ao amor, e me entregou de bandeja sensações que eu não experimentava há anos. Ela sabia do meu labirinto carnal, do qual eu negligenciava, dizendo pertencer a minha essência de mau caráter. Elizabeth me devolveu a inocência que eu havia perdido diante de situações incisas de meu governo e de minha família. Eu era um fugitivo da vida. Elisabeth levou as rosas, as roupas, todo o meu dinheiro, e alguns objetos culturais que eu mantinha em casa. Acordei sem nada, um tostão. Mas o envelope estava ao lado, com os trezentos dólares, o anel e uma carta escrita em bom português. Angenor assentava: “Estou saindo da Venezuela com seu dinheiro e com sua mulher, que, aliás, sempre foi minha”.

Não era a primeira vez. Reconstruí minha vida da mesma forma, e para mim, o envelope continua vazio. Se alma, sem nada.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

O semblante

Caminhando pelas ruas e, depois, rodando de ônibus, cheguei a seguinte conclusão: o inferno é aqui. Sim, aqui, ali, acolá. Pois bem. Esqueça tudo que você aprendeu sobre religião, esqueça aquelas velhas histórias para boi dormir contadas no ensino “infanto-fundamental”, sobre a perspectiva de “um Deus criador”. Eu sei que para você leitor crente, de direita religiosa, é difícil delir esse enredo sobre Cristo, cruz, Espírito Santo, Natal, Páscoa, Adão, Eva... A tal cobra. Mas vejamos o lado humano da coisa: o semblante. Essa idéia de que Jesus voltará é teologicamente utópica. Voltar para quê? Para dizer ao Lula que o Fome Zero é um plano magistral? “Olha Lula, vós tirásseis a fome do próximo”. E então aparece o capeta: “Tirásseis a fome com o que sobrais da roubalheira”. E Jesus objeta: “Lula, vós désseis melhorias ao SUS, criásseis o CSS, salvásseis a vida de muitos irmãos”; e o capeta retruca: “A criação do SUS foi jogada política, atíngi uma classe da população e não resolve nada, e o CSS é mais uma forma de arrecadação de impostos com falso cunho social”. A discussão política-econômica entre Jesus e (C)apeta se estenderia infinitamente, até quando não houvesse mais organismos humanos e o mundo fosse dominado pelas baratas atômicas. Metaforicamente, a vida foi criada assim. Em um bate-barba sem persuasão.

Evoluímos de tal modo que hoje nos deparamos com a nossa própria ignorância fazendo malabarismos em sinaleiras e pedindo um trocado para comprar pó. Meu antigo amigo britânico Charles Darwin fora franco desde o início: “O homem ainda traz em sua estrutura física a marca indelével de sua origem primitiva”. Nossas marcas estão espalhadas por todos os lados. Em ruas, motéis, escolas, boates, universidades, empresas, supermercados, shoppings... A marca física e supostamente racional revela a nossa ascendência. O semblante de nossa esfera social é uma só: o caos. A todo instante sofremos com distrações. Eleições, um novo plano de governo, uma moderna tecnologia, nos prendemos ao que temos ao nosso redor, é o pegável, de fácil manejo. Lemos pilhas de livros, estudamos teorias, e esquecemos de ler nossas almas e estudar a nós mesmos. Aí surge a hipocrisia de uma sociedade sem nível algum para julgar o que é certo, o que é errado. O sujeito que pede justiça, protestando defronte ao prédio onde Isabela Nardoni foi assassinada, é o mesmo que joga lixo no chão, que ultrapassa limite de velocidade, que não cede lugar a um idoso no transporte coletivo, que bate no seu filho para educar. E quer cobrar justiça para quê? Se for fazer parte do sistema, que ao menos seja coerente.

Tenho abusado muito de mim nos últimos dias, tenho refletido sobre meu papel incandescente na sociedade. Percebi que somos todos formiguinhas. Os dias tornam-se rotina, o fim de semana uma salvação, o salário uma glória divina mensal, e os gastos uma distração consumista neoliberal. Compramos carros, roupas, bebidas, objetos tecnológicos para quê? Estamos em um mar vermelho de ideologias. Cada cidadão tem a sua. E todos têm a razão. Esse é o problema, não há Deus para o saber popular, ou há até mais de um. O enigma do mundo somos nós humanos. O dia que aprendermos a olhar para o nosso próprio umbigo e agregar algo que nos faça realmente pensar... Já será tarde.

Ah... Esquecer-me-ia de outro fator relevante: o sexo. O apetite sexual pode acabar com uma família, por exemplo. Principalmente se o ‘convívio’ for desestruturado, o que é demasiadamente comum em nosso inferno atual. O sexo é o culpado de tudo. Da traição, da reprodução em massa, da vontade de viver... O sexo foge do campo prazeroso para dar margem ao erotismo exacerbado. Dia desses vi garotas orgulhosas de 12 ou 13 anos desfilando seus seios e bundas pela cidade. Estavam atraindo os machos, aqueles que não fazem uso do cérebro, senão para ativar a testosterona. Esse comportamento prega, mais uma vez, o semblante de nossa coletividade nas costas do papa: “Hey, velho católico, sou uma prostituta, me perdoa?”, “Não, minha filha, isso é muito corriqueiro, Papa só perdoa verdadeiros pecadores”. É... Darwin... É a evolução. Meu radicalismo me enjoa. Preciso tirar férias desse planeta.

PS: Férias com Mi Colibri.

sábado, 5 de julho de 2008

Para o momento...



Quantas coisas eu ainda vou provar?


E quantas vezes para porta eu vou olhar?


Quantos carros nessas ruas vão passar?


Enquanto ela não chegar...


Quantos dias eu ainda vou esperar?


E quantas estrelas eu vou tentar contar?


E quantas luzes na cidade vão se apagar?


Enquanto ela não chegar...



(Roberto Frejat.)