Coluna do Luan

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Sexta-feira com Lavoisier

Tenho pavor da sexta-feira. Sei que a qualquer momento o telefone de casa pode tocar, meu celular pode vibrar e alguma alma pensante pode me convidar para sair. O que eu faço? Digo que sou autista? Não, não posso mentir. A minha realidade é outra, amigos. É outra. Tento incontavelmente demonstrar isso para as pessoas que amo. Tento dizer até para aqueles de quem não gosto: minha vida é outra. Não sou como os garanhões da novela das oito, tampouco um baladeiro pós-adolescente. Amigos, pertenço a outros caminhos. Não gosto de ter que compartilhar meus problemas, mas às vezes é necessário. Assim como a solidão é necessária. Falei sobre a rotina de um organismo solitário no post de terça-feira e poucos leitores absorveram o que eu realmente quis dizer. Assim somos nós, alguns nos compreendem, outros não. Alguns nos pré-julgam, outros não. Alguns nos odeiam, outros não. Não quero me colocar como um extraterrestre, mas eu não integro a classe da grande maioria do público jovem. Contudo, também não me sinto como um quarentão. Eu sou apenas o Luan. Tenho meu passado e vivo meu presente que erroneamente projeta um futuro afobante. Esse sou eu. O Luan é aquele cara que não sai para qualquer lugar, ou sai, se a companhia for boa. O Luan valoriza uma amizade, principalmente as femininas. O Luan tem poucos e bons amigos (masculinos). E isso não faz do Luan um bissexual, ou um gay. E se fosse, qual seria o problema? Porém, o Luan é hetero. E talvez um dos heteros mais flexíveis desse planeta. O Luan dificilmente tem algum preconceito, ao contrário da sociedade em que vive.

Há momentos em que preciso deitar minha cabeça no travesseiro e chorar, eu tenho que chorar, fazer com que minhas lágrimas mostrem sentimentos a mim mesmo. Choro no escuro, no quarto, na sala, no banheiro, o ser humano deve carpir-se. Precisamos botar para fora nossas tristezas, angústias e até felicidades. Já viu alguém chorar por que está feliz? Pois bem, eu choro. Minha companhia mais concreta que possuo é o Lavoisier, meu ursinho de pelúcia. Durmo com o Lavoisier todas as noites. Ele não reclama se eventualmente eu ronco, se me mexo muito na cama e o destapo, se acordo tarde ou cedo demais, se leio livros em voz alta, se trago jornais antigos para o quarto. O Lavoisier é meu companheiro. Ele não rezinga de minha vida, ele me partilha com o seu mundo. Lavoisier é real, em um outro plano ele pode falar com outros ursinhos de pelúcia, ele pode ter até família. Achas loucura? Nosso cérebro é uma fábrica de ilusões, meus caros. A imaginação é veracidade mais madura que podemos ter. Se prender ao que vemos e tocamos é ignorância, o universo é mais do que nós mesmos.

Penso em tanta coisa que garotos de 20 anos jamais pensariam, falo pelos que conheço, são poucos os jovens existencialistas. O acesso à cultura inútil, a futilidade comercializada por nossa raça é mais rentável. É mais fácil, não há esforço mental. É fato, as pessoas não pensam. Não agregam nada ao intelecto. E para ser um intelectual você não precisa decorar pilhas de livros nem ler dez jornais por dia. Tudo que você precisa é tentar saber quem és. Por isso que são poucos os intelectuais. Raros, diria. Intelectualidade vira um cano de escape, já que não sabemos quem somos, falemos do que está ao nosso lado. Weber, Freud, Jung, Schopenhauer, Lacan, Heidegger, Nietzsche, Marx, Aristóteles e o ainda vivo Umberto Eco são exemplos de doutrinas diferentes, mas que em algum lugar houve um gancho. Eles com certeza não souberam e nem sabem quem foram ou são. Eles tiveram uma tese aproximada. Entretanto, enfeitaram suas dúvidas no comportamento, na reflexão, na história e até na sociopolítica. Enfeitaram e se auto-responderam. E isso os tornou intelectuais, só porque eles não fizeram o que mais da metade da população mundial faz: não progredir mentalmente.

A sexta-feira é uma das provas disso. “Eu trabalhei a semana inteira, vou curtir o finde”. Curtir? Beijar pessoas que mal conhecemos? Penetrar alguém que só sabemos o nome? Ou então, o mais corriqueiro: tomar litros e litros de cerveja a fio. Não, obrigado. Chame-me do que quiserem, me rotulem; ainda acho minha vida mais proveitosa do que as de muitos psicopatas sociais. A praga do ser humano é ser contagioso. Por favor, deixe-me só com Lavoisier, essa noite iremos beber suco de maracujá e discutiremos sobre o amor e o sexo no Jardim do Éden. Creio que estou me envolvendo sentimentalmente de novo. Sou vulnerável, sou humano. Até mais, amigos. Bom fim de semana.